sábado, 2 de julho de 2011

OS JOGOS


Justiça seja feita: também trago recordações e ensinamentos do internato, significativos e imprescindíveis para minha vida.

Aprender a jogar respeitando o adversário foi de fundamental importância para a minha formação quando adolescente e imprescindível para minha postura profissional em toda a minha vida, nessa louca sociedade moderna de concorrências e desenganos.

A integridade do ato, em si, me deu a força necessária para estabelecer em minha vida metas de ideais bem norteados, sem esbarrões sobre as atitudes muitas vezes sórdidas do meio. Neste aspecto, agradeço a educação que recebi, pautada na solidariedade e na concorrência não avassaladora do meio. Vencer não era massacrar. Perder não era a morte, mas apenas um passo de experiência e aprendizado, uma ocorrência da vida.

Este presente eu trouxe do colégio, apesar de tantos outros desacertos.

Ah... um pouco dessas freiras nas nossas atuais torcidas de futebol... e, por que não... nas concorrências da vida...

Esses princípios aprendíamos principalmente nos campeonatos de vôlei. Lembro-me de um outro internato, também de freiras e também no Alto da Boa Vista. Funcionava como uma comunidade solidária, um país vizinho, com relações diplomáticas bem delineadas entre nós. Um grupo visitava o outro, quando em vez, em festas de quermesses ou retiros e, principalmente, em treinos de vôlei. O objetivo era o de treinarmos como adversárias, pois treinar com outras táticas aguçava as nossas. Fazíamos vários jogos amistosos, em treinos não só de jogadoras, mas, também, de torcidas. Éramos, na verdade, duas sociedades irmãs e ficávamos torcendo para que nunca tivéssemos de nos confrontar nas preliminares, cruzando os dedos nos sorteios que determinariam em que grupo cada colégio pertenceria. Ficar no mesmo grupo significaria que um colégio acabaria por eliminar o outro e queríamos, ambos, que chegássemos juntos à final. Aí, sim, quem ganhasse ficaria com a taça e, fosse qual fosse, a alegria seria a mesma.

Evidentemente, nos confrontamos oficialmente várias vezes e lutávamos para vencer. Mas era interessante o decorrer de todo o jogo. Quando uma cortada fazia cair a adversária, não era um grito de raiva que surgia da jogadora que tinha sido focada e não conseguira pegar a bola, mas um cumprimento pela estratégia da adversária: “boa bola!”ou “bolão!”. O ponto perdido era arduamente disputado novamente, a luta era para valer, mas não para sobrepujar o outro. Vencer significava outra coisa diferente do que esmagar, tripudiar, desmerecer. Vencer era honrar a arte da batalha, o resultado do esforço.

Era interessante o quanto nos sentíamos “irmãs”. Nas vésperas de nossos jogos com outro algum adversário ouvíamos, no recreio após o jantar (que, coincidentemente era no mesmo horário para ambos os colégios), o “grito de guerra” e de estímulo de nossas colegas do outro lado da mata: Esses cantos ainda ecoam em meus ouvidos, ao me lembrar das coisas da adolescência. Esperávamos que acabassem de cantar, juntávamo-nos nos janelões do terração do recreio noturno e repetíamos o mesmo refrão para as nossas queridas companheiras, para acusar o recebimento da mensagem. O grito guerreiro, atravessando a escuridão e o silêncio da mata da Tijuca, ecoava em nossos corações, no quase um quilômetro que separava os dois prédios.

Lição de vida...

Havia também um encantamento nas partidas com as outras adversárias. Sabíamos que nem todos os colégios tinham os nossos princípios ou a nossa postura que considerávamos “ética”. Mas não respondíamos no mesmo tom. Sequer lamentávamos. Era como se isso não contasse para nós, “princesas” que éramos. Apenas deixávamos que isso acontecesse e seguíamos o nosso curso, tanto jogadoras, quanto torcida, ignorando vaias e respondendo com uma diplomacia um tanto “superior”. Isso nos fora ensinado explicitamente pelas irmãs do colégio e, embora a intenção educacional fosse das melhores, acho que esse “tom” de superioridade custou-me um certo ar de arrogância aos ataques adversários e competitivos, postura que me acompanhou por alguns dos meus primeiros anos de adúlticia, felizmente contornados (ou, pelo menos, amenizados) pelas pauladas da vida.

Boa base, boas escolhas, embora tivesse de ter passado pelo árduo trabalho de aprender a temperar a educação chamada “esmerada” com o bom senso. Neste caso, o bom equilíbrio entre as freiras e as experiências de vida.

De qualquer modo, o que aprendemos na disputa através dos jogos foi fundamental para as alunas que souberam usufruir desse ensinamento.

Agradeço à vida por essa oportunidade, pois deu brilho a minhas vitórias, compreensão e aprendizagem nas minhas derrotas. E sensatez.

3 comentários:

Celina disse...

É querida, aprender a perder e ver que o outro ou a vida nos ensinou algo é aprender a viver com amor pelas conquistas e "carinho" pelas derrotas. Afinal, são elas que fazem a gente REPENSAR e mudar de estratégia. bjs

pblower disse...

Eulália...jogadora de volei. Grande atleta da e para a vida!
beijocas
pat

Miriam disse...

Pois é, a ética, o respeito, saber que tínhamos adversários apenas na hora do jogo. Não eramos inimigos, muito menos inimigos para sempre...
Ganhar ou perder, as duas faces da mesma moeda e cada uma delas um aprendizado.
Bjs. Miriam