sábado, 16 de julho de 2011

A DÍVIDA



Setembro de 2006. Ufa... no início do ano tinha comprado a sala que seria o meu consultório, depois de muito procurar e de ter ralado por muitos anos por essa conquista, como já lhe contei no conto “ A compra”.

Pois então: a sala estava lá, em reconstrução, contando com Gildo, meu substituto do China, aquele do conto da casa do Humaitá, que foi morar no nordeste.

Gildo agora é meu braço direito para tudo, no que se refere a obras... e tão cuidadoso, quanto amigo. Tão especial que dei um jeito de apresenta-lo a Jane, minha secretária das sextas-feiras. E não é que se casaram, já há uns 10 anos? Isso vale um conto à parte algum dia. Mas voltemos à sala.

Gildo, além da super confiança que inspira, tem também um super bom-gosto e, treinado como é em obras dos mais vários tipos, ia levando a obra, sozinho, reconstruindo e sugerindo. Ficou um primor! Quem já viu a sala pode confirmar.

Mas, como toda obra, a gente acaba gastando mais do que pensa... e a grana estava mesmo muito curta. Tudo vinha sendo feito aos poucos, mas, mesmo assim...

O fato é que, numa quinta-feira, me deparei com uma quantia acumulada para pagar na terça seguinte: material já comprado, prestação do ar condicionado, gesseiro, enfim, um total que eu não tinha. Para muitos, talvez, uma micharia, mas para mim... era o suficiente para entrar em pânico.

Apelei para a calma taurina, se é que conseguia ter alguma naquela hora. Se você sabe, a última coisa que um taurino faz é pedir empréstimo. Ai, pelos deuses... eu tinha de escapar dessa! Como?

Por incrível que pareça, como boa reikiana, investi em um dos princípios do Reiki: “Shinpai suna”, ou seja, “não se preocupe”. Mas é claro que não significa um “não se preocupe e não faça nada por isso”. Não. Significa tomar todas as providências necessárias, lutar por resolver o que deve ser resolvido e, só então... confiar. “Shinpai suna” significa, na verdade, fazer a sua parte... e... confiar. Eu não sei como isso funciona, mas funciona... só que, daquela vez, não me parecia mesmo haver saída.

Mas fiz como manda o figurino, como mestre de Reiki que sou. O exemplo começa aqui, não é mesmo? Então... vamos às providências: fui ao banco e falei com Cristina, uma gerente de sonhos, que já se aposentou. Pedi instruções de como faria um empréstimo, com o coração na mão, diga-se de passagem. Ela me informou tudinho, me passou um monte de formulários e me aconselhou a fazer o empréstimo no dia seguinte mesmo, ou seja, sexta, para o dinheiro estar na minha conta na segunda e eu saldar as dívidas na terça, com o dinheiro depositado. Eu não quis. Disse que só faria o empréstimo em cima da hora, na segunda. Ela poderia colocar o dinheiro na terça para mim? Poderia, mas achava uma bobagem sem tamanho, pois não faria diferença nenhuma em relação a juros, pois a quantia nem era tão significante, e tudo seria feito com calma. Não aceitei. Finquei pé na segunda, dizendo que levaria os formulários para casa e já traria tudo certinho na segunda, na hora da abertura do banco.

- Por quê?

- Sei lá... porque sim. Vou me sentir melhor assim.

- E se eu faltar na segunda?

- Não vai faltar, Cristina e... se faltar, paciência... consigo o empréstimo mesmo assim?

- Consegue, mas não garanto que o dinheiro caia na terça.

- Ok, sempre paguei tudo em dia. Darei os cheques na terça pedindo aos meus credores que depositem na quarta. Sei que me entenderão.


E foi assim que finquei mesmo o pé. Minha confiança estaria em jogo até o último minuto. Quem sabe eu poderia encontrar outra saída... teria o final de semana inteiro para pensar em outras possibilidades...

Na sexta, passei no banco para pagar uma conta pequena e, nem sei por que, olhei o saldo. Havia um dinheiro lá que, com certeza, não era meu. Corri para Cristina:

- Você depositou o empréstimo?

- Eu não, você nem assinou os formulários ainda! Não poderia faze-lo!

- Então, tem um dinheiro lá que não é meu. Veja qual foi o engano, por favor, antes que isso dê um problemão nas transações da minha conta! De quem será isso?


Cristina acessou a conta. Sim, não havia dúvida: o dinheiro estava lá... acessou outras telas do sistema... mais um minuto... e ela sorriu:

- Lali, devolução do seu Imposto de Renda!

Ai, pelos deuses! Não era possível!!!


Paguei tudo e lembro que me sobraram uns pouquíssimos trocados! Deu só para uma comprinha básica de uns chocolates da Kopenhagen, com que fiz questão de me presentear para comemorar a aventura, oferecendo uns bons pedaços, em pensamento, ao meu anjo desconhecido, aquele que me salva nas horas inesperadas.

Pois é... shinpai suna!

2 comentários:

Celina disse...

Eu só não sabia o nome, mas pratico isso há um tempão! me pelo de medo de dívidas, e quando a coisa tá preta eu pratico a caixinha... escrevo num papel um agradecimento pela coisa resolvida. Me dá um alívio e a coisa se realiza, meio que por milagre!
Vamos combinar que a gente tem fazer por merecer, né?

Décio disse...

querida Eulalia, realmente valeu a pena: asala é linda e aconchegante! Como vc ...
Agora, o que me impressiona é o teu anjo, capaz de acionar a Receita Federal! Nossa! Bem, mas é claro que vc faz por onde, né? Meu bj ...