sábado, 25 de junho de 2011

TONIQUINHO


Irmã Antonieta foi nossa mestra de classe no quarto ano fundamental, naquela época intitulado quarto ano primário.

Para fazer contraste com a Irmã “Cruz Credo”, eu tinha de contar, também, minha história com Irma Toniquinho. Pois é... Toniquinho ou Tonico foi como a minha turma apelidou essa religiosa nascida para ser mãe.

Claro que às vezes fazia sua cara amarrada, mas era até engraçado, pois não levava jeito para isso. O fato é que, com sua amorosidade, ela conseguia tudo da gente e não me lembro de uma disciplina consentida tão perfeita em outro ano de internato. Nós queríamos agradá-la, esta é a verdade, brindá-la com nosso amor, por tanto amor recebido.

Alda, uma de minhas colegas, foi quem colocou o apelido, que coincidia, perfeitamente, com o perfil da irmã: pequenina de porte, faceira, espertinha e descolada nas respostas às perguntas mais incríveis que inventávamos para lhe fazer. Não era jovem de corpo, mas era jovem e bem responsável de espírito. Sentíamos que estávamos seguras com ela, ao mesmo tempo sábia e brincalhona, o ideal para cuidar com amor e aconchego de uma turma de meninas que contavam entre 10 e 11 anos de idade.

Um dia, sem querer, Alda, em vez de chamá-la pelo nome, tascou o apelido:

- Irmã Toniquinho!

A freira se virou de pronto, a turma congelou. E agora? Ela descobrira! Acostumadas que estávamos às ranzizices das freiras das turmas anteriores, esperávamos que, mesmo sendo muito boazinha, Alda contaria com uma boa reprimenda, no mínimo!

Lembro-me que todas silenciamos, olhos fitos na freira. Ela primeiro ficou muito séria, depois soltou um pequeno sorriso e disse que precisava falar com todas, quando chegássemos à sala de estudos. Estávamos no recreio do jantar, isto é, misturadas com alunas de outras séries. E havia uma etiqueta bem protocolar no colégio: cada turma tinha lá os seus problemas e a mestre de classe jamais os expunha em público. Em outros termos, bem cedo aprendi que “roupa suja se lava em casa”.

Seguimos para a sala e fomos surpreendidas com o seguinte discurso:

- Meninas, eu já conhecia esse apelido que vocês me deram às escondidas. Fico agradecida pelo carinho e o acho muito bonito. Só que precisamos combinar uma coisa: ninguém pode saber disso em público. Não fica bem vocês chamarem sua mestra de classe de “Toniquinho” ou “Tonico”. Assim, vamos restringir esse tratamento aos momentos em que apenas nós estivermos presentes. E tomem muito cuidado, quando estiverem em público.

Não é preciso dizer que todas nos levantamos dos lugares e a rodeamos tão cheias de amor no coração quanto o amor que ela tinha para nos dar. Toniquinho aceitava o tratamento de você, não de senhora, como era de praxe entre alunos e mestres, sabendo de sobra que respeito se faz com o convívio e não com imposição. Mas tudo “só entre nós” segredo que nos aguçava, ainda meninas, a cumplicidade necessária para a conquista de nossos ainda tão ingênuos corações.

Tonico ou Toniquinho conseguia tudo que queria: desde filas impecáveis e silenciosas nos corredores, como o melhor comportamento à mesa do refeitório, postura impecável na Capela, pontualidade, assiduidade, e compromisso. Tudo feito com alegria, bom gosto, satisfação. No recreio, dessarte não ser tão jovem, Toniquinho jogava queimado com a gente e também participava do pique bandeira. Era mesmo muito diferente de tudo que vivi, entre todas as experiências de meus dez anos de internato.

Para melhorar a história, não sei como, embora fosse critério do colégio que as mestras permanecessem sempre como guardiães da mesma série e nós é que mudássemos de mestre de classe a cada ano letivo, Toniquinho foi nossa mestra por dois anos seguidos: quarta e quinta série fundamentais. Eu acho que ela mesma deve ter mexido lá os seus pauzinhos, pois, com toda certeza, nunca teve uma turma em que ela sentisse tanto amor transbordar. Uma pena não poder nos seguir por todo o percurso acadêmico. Eu teria sido brindada com a melhor “mãe” do colégio.

Mas, tudo bem... eu e toda a turma tivemos a oportunidade de viver dois anos da mais pura harmonia e encantamento. Toniquinho sempre esteve ao nosso lado de uma forma muito especial, ensinando, curtindo, disciplinando e incentivando nossas mentes e nossos corações para mostrar-nos as melhores qualidades do ser humano em si mesmo e em convívio com os demais.

Toniquinho, onde quer que você esteja - provavelmente sendo chamada de Toniquinho pelos anjos -, obrigada, querida, devo muito do que sou a você!

Tim-tim!

3 comentários:

Anônimo disse...

A amorosidade é a grande mestra, não é, querida? Acho que ela permeia as grandes lições. Aquelas que incluem o coração. Aquelas que ficam.
Amoroso conto, permeado de gratidão, esse sentimento tão presente em você e nos seus textos.
Beijos

Celina disse...

Querida, quanta riqueza suas estória de colégio. Sei bem como é encontrar uma freira amiga. No São Vicente eu era uma peste, mas tinha uma que sempre me ajudava a escapar das anotações na cadernete (que já tinha encarte!
Adorei!

Décio disse...

Puxa! Demorou esta semana a sair o conto!Por onde você andava? bjs e bjs