Braga, Minho – Portugal, 1975.
Fiquei
sem ver meu pai dos 11 aos 24 anos de idade e esta mesa foi a primeira que vi
posta, em sua casa, no dia em que cheguei.
Ele
havia subido para o seu quarto para refrescar-se do que chamava o verão de
Braga (para mim, um verão gostoso e cheio de vida), enquanto a jovem governanta, prestimosa, fazia as honras da casa. Colocou sua sopa no prato e, enquanto sua
auxiliar se preparava para servir os outros pratos, ela fez menção de chamá-lo
para o jantar.
Foi
nesse instante que, não sei por quê, tomei a dianteira, pus-me ao “pé da escada”,
como eles diriam, e gritei lá para cima:
- Papai, moço mesa!
Um
eco do passado, muito, muito distante... Era assim que o chamava, em São Paulo,
quando tinha pouco menos de dois anos de idade, toda vez que minha mãe me
mandava avisar “que o almoço estava na
mesa”. Eu só sabia disso porque, ainda pequena, ele sempre comentava o fato
comigo. E, na despedida, quando me disse que voltaria para Portugal, ainda
havia me lembrado:
- Você era tão
pequena, falou tão cedo... Me chamava para o almoço ou para o jantar se debruçando
“ao pé” da escada que dava para o meu laboratório e gritava: “Papai, moço mesa”.
E... agora... já está tão crescida...
Talvez
por ter sido essa a última lembrança que tivera, de tantos anos atrás, que
tentei, assim, resgatar não sei o quê de anos passados, perdidos no tempo.
Só
hoje, já avó e, por isso mesmo, sentindo
o que uma criança é capaz de fazer aos nossos anos já tão vividos, é que posso
entender sua silhueta a olhar-me lá de cima, a descer devagar e a tentar
reconhecer, naquela jovem de 24 anos de idade, a menina tão pequena, mas já não
tão inocente.
Lembro-me
como em um retrato, do homem duro e inflexível, embora curvado pelos seus setenta anos,
sorrindo e descendo os degraus devagar, escondendo a voz meio embargada pela
lembrança dos anos:
-
Já vou... já vou...
Ser
avó, é viver ou reviver profundamente.
E
mesmo que a vida tenha mostrado muitos dissabores... lembrar... e sorrir!
6 comentários:
Querida,
Consegui sentir a emoção em cada letra! Um conto que conta um livro de sentimentos. Uma longa estória...
bjos com saudade!
Belo conto ! Eu falava o mesmo para meu saudoso pai, quando minha mãe avisava que a comida estava na mesa. Essa bela história desencadeou muita saudade.
Lindo texto! Lindo!
Emoção, vó Lali. Emoção. E vamos juntas construindo novas lembranças assim.
Amei seu blog, especialmente sua história contada em fotos! Muito linda e especial! Como você! Obrigada por me visitar e comentar e elogiar!
Abraço fraterno
Ana Cristina
É, queridos... há passagens da vida que vale mesmo a pena relembrar!
Adorei os comentários!
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