sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

NOTAUSGANG


Alemanha, de novo! Patrícia diz que, um dia, acabo morando lá. Acho pouco provável... mas... nunca se sabe. O importante é que as lembranças são boas, amorosas, delicadas e algumas, como você já pôde constatar, engraçadas.

Lembro-me de minhas visitas às lojas. Sim... eu também visitava as lojas, como qualquer mulher mortal. Não tanto quanto era de se esperar para o natural instinto feminino de consumo, mas visitava. E consumia. Principalmente artigos de papelaria, nos quais a Alemanha é pródiga em mimos e gracinhas. Me dei conta de que não tenho nenhuma foto de lojas alemãs por dentro... incrível. Mas são magníficas. A Ka De We, em Berlim (foto), chegava a ser uma covardia... será que ainda existe? Se existe, provavelmente, depois da queda do muro, deve ter mudado de nome ou virado simplesmente Kaufhof, como nas demais cidades do país (Ka De We era uma sigla carinhosa para "Kaufhof dos Ocidentais").

O problema, muitas vezes, era encontrar a saída. Algumas lojas são tão grandes, que você literalmente se perde por dentro. E olha que eu tenho um bom senso de direção - sei exatamente onde estaciono meu carro na garagem de um shopping imenso. Mas aqueles departamentos sem tamanho são mesmo um desafio a qualquer ser vivente.

Pois então... no começo, algumas (muitas) vezes, senti dificuldade de encontrar a saída. Tinha em minha mente as palavras-chave: eingang (entrada) e ausgang (saída). Para mim, era só procurar alguma referência em placas ou setas, antes de perguntar a qualquer vendedor disponível. E explico por quê: ocorre que os vendedores atendem a uma pessoa de cada vez. Inexoravelmente. São super atenciosos e exclusivos. Não cabe, como aqui, por exemplo, você pedir licença e apenas perguntar: “tem fita adesiva?”. Aqui você pode fazer isso e já tem meio caminho andado: o vendedor aponta onde é o local da sessão e continua tranquilamente a atender o seu cliente. Ninguém se incomoda, não atrapalha ninguém e se não tiver, você não fica esperando à toa. Muito prático.

Lá, não. Ou você procura por conta própria entre as inumeráveis prateleiras ou espera a sua vez. O bom é que, chegada a sua vez, o atendente será exclusivamente seu e... se tiver fita adesiva, ele mostrará quilômetros de prateleiras com os mais diversos tipos, disposto a descrever calmamente as façanhas que cada uma delas é capaz de fazer. E diretamente em inglês, língua que todo atendente diz que não sabe falar, se você perguntar (mania de perfeição), mas, fala muito bem, se você se dirigir a ele diretamente nessa língua. É claro que as sessões são pródigas em setas, placas, avisos informativos. Mas isso tudo está escrito no mais puro alemão, é lógico, e dispensa metade da espera. Mas... para uma viajante latina como eu... hum... como é mesmo fita adesiva em alemão???

Pois é... com esse tipo de cultura, interromper um atendimento, mesmo que seja só para perguntar como se sai da loja estava fora de questão. Era mesmo procurar pelos avisos, setas, placas e cartazes.

Foi aí que me enrolei, pois, com muita freqüência, fugi exatamente do caminho certo, por um vício de linguagem. É que encontrava a placa sinalizadora: “notausgang”.

Ora, se a língua é anglo-germânica e not em inglês é uma palavra negativa, a linguista aqui só poderia concluir que “notausgang” deveria significar, é claro, “não há saída por aqui”. Eu não entendia bem por que os alemães se preocupavam em avisar que não havia saída por ali, mas, como não se discute com a minuciosidade das descrições do temperamento alemão eu estava achando que era apenas uma informação a mais. Imediatamente, mudava o meu rumo em outra direção, em vez de seguir exatamente em frente, que era o que eu deveria fazer.

Levei cerca de uma semana enrolada por essa armadilha até que, um dia, resolvi seguir o “notausgang” para ver no que dava... e dei numa escada de serviço que me colocou bonitinha na calçada, ao lado do prédio.

Só então decidi procurar no dicionário pelo significado. Fiquei pasma e lembro-me que chorei de rir comigo mesma por algum tempo: notausgang – saída de emergência.

Daí por diante, cada vez que via “notausgang”, além de sorrir para mim mesma, passava por ela e continuava alguns passos na mesma direção e, indubitavelmente, encontrava a magnífica e tantas vezes perseguida placa de “ausgang”.

3 comentários:

Unknown disse...

querida,
gostei do conto e, ainda por cime, aprendi algo que desconhecia em alem~~ao. Fiquei rindo aqui comigo porque, se a sua hipótese tivesse se confirmado - se "notausgang" realmente significasse "a saída não está aqui" - eu teria a certeza de que vc havia se enganado e estava mesmo em Lisboa, e não em uma cidade alemã!
bjs

Eulalia disse...

ahahahahahhahahahah!
valeu!

pblower disse...

Agora que sei que vc sabe bem entrar e sair da e na Alemanha, tenho certeza de que vc vai passar um tempo lá (rsrsrsr)