Quando vejo algo muito
errado, muitas vezes, minha curiosidade científica fica aguçada, mesmo que seja
um evento cotidiano e, principalmente, se causa espanto ou consternação.
É o caso do trânsito de
nossos ônibus.
Com muita frequência,
vejo meus amigos reclamando - e com muita razão - do comportamento de nossos
motoristas que, simplesmente, não param nos pontos. Passam por fora, ignorando
os acenos tantas vezes desesperados de candidatos a passageiros que já os
esperavam "faz tempo"! Sim,
candidatos, pois, uma vez no ponto, você se torna um suposto candidato a
conseguir chegar ou não ao seu destino no tempo previsto.
Por que isto está
acontecendo? Pura impaciência do motorista, intolerância, insensibilidade ao
próximo, vontade de correr, aproveitar a pista vazia?
Após alguma
investigação, em papos informais com os próprios motoristas - afinal, minha vida acadêmica foi recheada de levantamento de dados em
pesquisa de campo - acabei por chegar a uma conclusão estarrecedora.
Por incrível que
pareça, muitas empresas de ônibus exigem e pressionam os motoristas a
realizarem um mínimo de viagens por dia. E não são poucas.
Como assim, um mínimo
de viagens por dia?
Alguns desses empresários já se deram ao trabalho de saírem de seus confortáveis carros caríssimos, cheios de recursos confortabilíssimos e com todas as chances de mudarem de roteiro, escolhendo os melhores caminhos para chegarem aos seus objetivos? Será que já se sentaram na cadeira do motorista de seus ônibus, em pleno verão carioca, suando em bicas para levar a bom termo seu dia de trabalho, com toda essa pressão?
Claro que não!
Alguns desses empresários já se deram ao trabalho de saírem de seus confortáveis carros caríssimos, cheios de recursos confortabilíssimos e com todas as chances de mudarem de roteiro, escolhendo os melhores caminhos para chegarem aos seus objetivos? Será que já se sentaram na cadeira do motorista de seus ônibus, em pleno verão carioca, suando em bicas para levar a bom termo seu dia de trabalho, com toda essa pressão?
Claro que não!
Todos nós reclamamos do
trânsito, nessa cidade que cresceu desproporcionalmente. Venho a pé do
consultório para casa todos os dias. Seja às 20 horas, seja mais tarde, a
Avenida Nossa Senhora de Copacabana está entupida de carros. Muitas vezes,
andam quase passo a passo comigo!
Entendo, portanto, por
que muitos motoristas passam ao largo, sem pararem nos pontos, todas as vezes
que veem uma pista mais vazia, uma brecha no trânsito, uma forma de chegarem
mais rápido. Deixaram de ser motoristas de transporte público para serem
cidadãos ameaçados que precisam alcançar metas para garantirem seus empregos.
Resultado: mau
atendimento ao passageiro, objeto direto do serviço; desgaste desnecessário do
motorista que se empenha (tantas vezes inutilmente) para alcançar sua meta
quase impossível; prejuízo dos donos das empresas, pois, além de perderem
inúmeros passageiros com esta manobra de seus funcionários, veem seus ônibus
muitas vezes depredados pela população indignada - perda muito maior do que
deixar que seus motoristas trabalhem naturalmente.
Explica, mas não justifica. Tem sentido? Claro que não.
Perdem todos,
inclusive, o capitalista sedento de lucros e muito longe de saber, sequer,
gerir com sabedoria o seu negócio. E não é só por sua sedenta ignorância, mas,
principalmente, pela perda da verdadeira maneira humana de ser.
3 comentários:
Também fiz pesquisa de campo.
Há dua coisas:
1) completando o mínimo de viagem no mínimo de tempo, os motoristas (e isso eles, espertamente, omitemn nas entrevistas), podem ir pra casa mais cedo, coisa que qualquer trabalhador faz;
2) os orgãos fiscalizadores (prefeitura e fiscalização trabalhista) sabem disso e fazem vista grossa, pois a pressão dos empresários é forte até demais a ponto de o governo (Dilma) não ter sancionado projeto de lei determinando licitação no setor, jogando essa medida pras cucuias.
Vai demorar muito pra melhorar...
Querido,
Se eu fosse motorista, trabalhando com essa pressão toda, diria que o argumento não justifica. Nenhuma pressão dessas se justifica. O que resta é mesmo tentar se livrar da pressão o mais depressa possível, antes que outra pressão, a cardíaca, dê conta de fazer o pior serviço.
Os funcionários que trabalhavam comigo podiam ir para casa mais cedo,desde que cumpridas as tarefas do dia. Só que não tinham pressa. E acredito que era por uma simples razão: se o ambiente de trabalho é bom, isso estimula a pessoa a ser boa também.
Eulalia, transporte público no Brasil é piada! É triste e vergonhoso, mas é a pura verdade.
Postar um comentário