sábado, 2 de fevereiro de 2013

RAINHA DO MAR



2 de fevereiro.

Se algum(a) carioca sair distraído(a) de casa, esbarra  com flores, em cada esquina, para lembrá-lo(a): é dia de Iemanjá.

Com todo respeito a todas as religiões, sem exceção, acabei concluindo que religiosidade e religião são coisas distintas e uma pode existir sem a outra, independente de qual das duas está no comando da situação.

Acabei confirmando esta minha convicção, quando entrei em contato com o budismo japonês. Oitenta por cento dos japoneses são budistas e... cem por cento são xintoístas. O xintoísmo não é uma religião e, sim, um profundo e indescritível respeito a uma religiosidade inata no japonês, um culto fundamentado na sacralidade da natureza. Ele pode não ter religião, mas ele “é” xintoísta. Se você pergunta a um japonês se ele é xintoísta, ele responde:

- Sou japonês!...

É a essa religiosidade que me refiro. E foi assim que entendi esse culto naturalista do carioca.

Não importa se você é católico ou espírita, ou de outra religião. Dar uma entradinha no mar, para agradecer as bênçãos recebidas, faz parte da nossa cultura. Você pode até não ir lá, mas sabe muito bem o que significa levar umas flores brancas a Iemanjá. Carioca que não sabe o que isso significa me desculpe... não é carioca...

Fui católica por imposição do internato dos 7 aos 18 anos de idade. Depois disso, vaguei meio solta entre livros de esoterismo, budismo e “nadismo”. Acabei optando pelo “nadismo”, o que não interferiu na minha fé.

É por isso que entendo o que o dia 2 de fevereiro significa. Significa que, independente de sua religião, o lado “religiosidade” de nossa gente carioca, sabe que é aniversário de Iemanjá. Pode não ir lá, mas sabe. E nossas praias ficam enfeitadas com rosas e palmas brancas, durante todo o dia.

Antes, as pessoas faziam isso de madrugada, para não chamar a atenção. Hoje, felizmente, fazem à luz do dia mesmo, na hora de ir à praia, passando pela esquina e comprando as flores para brindar a Rainha do Mar. E fica bonito esse “xintoísmo” carioca, essa luz de alma de nosso povo, enfeitando a orla de nossos mares, nessa fé que vem de dentro, pois, nessa hora, não somos católicos, nem espíritas, nem evangélicos, nem nada. Somos filhos dessa cultura.

Somos cariocas e não podemos deixar de nos lembrar da aniversariante do ano, a mãe das águas salgadas, onde refrescamos nossos corpos e nossas almas, ao som do mar e à luz de céu profundo. E pedimos a bênção do mar, com os católicos vergando seu corpo para molharem sua mão direita e com ela se benzerem, antes do primeiro mergulho, com os espíritas saudando as ondas ou com os “nadistas”, como tantos, levando suas flores e agradecendo pelas bênçãos recebidas pela vida e pelos esforços de seu dia-a-dia.

O carioca é fervoroso por nascimento, mesmo que ele seja “ateu”. É engraçado como isso funciona. Na verdade, nem tem mesmo muita explicação.

Mas é bonito, é lindo mesmo. E é inefavelmente um jeito carioca de ser.

2 de fevereiro. Como "nadista" que sou, a caminho da praia  hoje de manhã, topei com uma das esquinas enfeitadas pela venda de lindíssimas rosas brancas. Geralmente, se compram 3, 7, 14 ou 21... faz parte do culto.

Comprei oito. Sete para a Rainha do Mar, que se foram nas ondas calmas e doces da aniversariante, agradecida pela lembrança, pelo carinho, pelo gesto carioca e respeitosamente concretizado por esta “nadista” fervorosa.

A oitava eu trouxe para casa, para lembrar e festejar, carioca e carinhosamente, nossa Mãe das Águas Salgadas.

Salve Iemanjá, vestida de Nossa Senhora pelos católicos, de Kuan Yin pelos chineses, de Sanju Kanon pelos japoneses, de Deusa Mãe pelos cretenses da antiguidade, de Deméter pelos olímpicos...

Salve nossa mãe terra, que se estende pelo mar.

Sejam quais forem suas vestes e suas manifestações, homenageio, hoje, o sagrado simbolismo de “Ser Mãe”, de ser a mãe que de dentro de nós cultuamos, arquetipicamente, todos os dias, em nossos corações.

Salve Iemanjá! Salve a Rainha do Mar!

3 comentários:

Celina disse...

Salve! Que texto lindo, Eulalia! Mandei mentalmente minhas flores a ela em plena Budapest. Sabia que era dia dela. E acho uma das figuras mais lindas de nossa cultura. (Seu texto foi um bálsamo, no meio da mudança! Estou no ónibus indo e vindo) bjs

Celina disse...

Salve! Que texto lindo, Eulalia! Mandei mentalmente minhas flores a ela em plena Budapest. Sabia que era dia dela. E acho uma das figuras mais lindas de nossa cultura. (Seu texto foi um bálsamo, no meio da mudança! Estou no ónibus indo e vindo) bjs

Eulalia disse...

Querida! Depois dos dias magníficos em Budapeste, espero que você se acomode rapidinho para poder curtir as lembranças da viagem e da casa nova!!!

Obrigada pelo comentário! Bom saber que temos uma carioca também
"fervorosa" por aí! (rs)