Gosto dos múltiplos de três. Aliás, o três me
persegue desde pequena. Tudo meu acabava em três. Eu adorava quando o três aparecia em minha
vida e, talvez por isso mesmo, ele acaba aparecendo muito, mesmo sem que eu vá
atrás dele.
Só para ter uma ideia, considerando as coisas
concretas, o número do meu prédio é múltiplo de três, o número do meu apto
idem. O número da sala do meu consultório, quando me dei conta, vi que era
1227. Idem a placa do carro. Não escolhi nada disso... mas o três vive
enfeitando minha vida. E me traz sorte.
Assim, fazer 63 anos é uma festa de três. É
bem-vindo e, com saúde, melhor ainda!...
Elegi o dia para passear muito, visitando lugares do
Rio que amo tanto. E a Cascatinha da Tijuca é o meu lugar preferido! Nós nos apresentamos
quando eu tinha uns três anos de idade e meu pai me levava para visitar a
Floresta da Tijuca. Não consigo me lembrar de minha vida sem essa cascatinha.
Quando entrei para o colégio, eu a via sempre, pois ela fica a apenas uns 500
metros de distância. Era quase um passeio semanal. Depois, adulta e morando na
zona sul, distante uma meia hora de carro, continuei sempre indo vê-la. Acho
que temos uma cumplicidade materno-filial. Ela sabe da minha vida mais do que qualquer
gente que conheço, mesmo os mais íntimos, já que me acompanhou desde bem
pequenininha, quando eu mal sabia correr em sua direção.
Agora, aos sessenta e três, fico feliz em visitá-la,
ver que as pessoas que amamos passam, mas ela fica. É como se o espaço de
segurança estivesse sempre ali, ao meu alcance. Então, no dia do meu
aniversário, fui conversar com ela e fiquei bem feliz de poder apresentar
minhas primeiras rugas a essa mãe sempre presente em minha vida.
Eu a conheço vestida das mais variadas formas:
pujante e cheia, no período das chuvas e discreta como agora, nesta estiagem. É
sempre linda e cheia de delicadezas, enfeitando-se a sua volta com copos-de-leite,
avencas, flores silvestres, mudando sua aparência a cada época do ano.
Como ela, percebo minhas metamorfoses físicas e
psíquicas no decorrer dessa jornada. É bom crescer, amadurecer, envelhecer. É
bom ver que o corpo muda, mas é melhor ainda ver que a alma muda. Para o bem e
para o mal, é bom saber que não estou estática, vazia, igual, que sou outra,
continuando a mesma, que sou uma e várias, que me busco a cada passo, que me
refaço e desfaço, que "me acerto"
e que "me erro" e que me reconstruo e desconstruo... que sei que vivo...
que não passo em vão.
É bom fazer 63. Lembro-me que pensei em 63 quando
fiz 36. E lembro-me de que me perguntei como eu estaria... se "estaria". Agora,
eu sei. Também me fiz essa pergunta quando fiz 39. Vou deixar que a vida me
conte...
Por enquanto, aproveitei meu dia de 63, visitando
minha mãe natural, em sua água translúcida e pura. É sempre translúcida e pura.
Que a floresta a guarde assim!...
De presente de aniversário, ganhei uma lua cheia
também. Corri no final da tarde para pegá-la em sua ascensão... mas ela,
manhosa e cheia de dengos, não quis se mostrar a mim em seu despenteado
acordar. Escondeu-se atrás das nuvens e só me apareceu já madura, adulta e
plena. Acho que como a aniversariante...
Muito linda. Lua de maio. O Grande Wesak...
Não agradeço à vida por ter chegado até aqui.
Agradeço por ter chegado aqui desta forma, com todos os revezes, todos os
percalços e também todas as coisas belas e magníficas que os olhos de minha alma puderam
ver e viver.
E, como o três me traz muita sorte, que venha com
seus ensinamentos e surpresas. Estou pronta.