Apesar de todas as intempéries,
fui especialmente brindada por certos amores. Refiro-me a todas as espécies de
amores. Mas, hoje, de forma pontual e agradecida, brindo a vida pelo amor de
meu querido primo Manuel.
Se
você leu o conto “Golpe de Mestre” sabe a que me refiro. Se não leu e quiser
conhecer melhor essa estrela de minha vida, vale a pena fazer uma visitinha ao
texto, escrito em 03 de abril de 2010 (http://blogdaeulalia.blogspot.com.br/2010/04/tudo-comecou-quando-vi-o-filme-golpe-de.html).
Primo
Manuel teria feito aniversário no último dia 20, quarta-feira. Para mim, sempre
fará aniversário neste dia, pois está vivo, vivíssimo em meu coração.
Estive
para escrever sobre ele desde o ano passado, quando soube de seu falecimento.
Uma gracinha de neta me deu a notícia, numa carta tão amorosa quanto as que
dele recebia. Tentei escrever sobre ele várias vezes, sem sucesso. Manuel é muito
maior que as palavras e, por mais que tentasse, meus dedos ficavam imóveis no
teclado.
Guardo
Manuel não como um primo, mas como um verdadeiro pai que tive, durante uma vida
muitas vezes bastante atribulada. Morando em Portugal e eu aqui, não havia mês
que eu não recebesse uma carta (a não ser quando ele ficava doente...), como
pai zeloso e carinhoso que busca notícias da “filhota” distante. Assim, de 1985
para cá, quando nos reencontramos mais efetivamente, consegui juntar mais de
uma centena de cartas. Todas foram, naturalmente, respondidas com o mesmo amor
caloroso e filial.
Tenho-as
em uma caixinha, especialmente guardada para este fim. Não sinto vontade de ler
nenhuma, pois me parece totalmente dispensável. O sentimento que ele fez
florescer já é combustível bastante para o resto da vida., sem necessitar de
suporte material. Guardo-as por respeito, por amor, por dedicação singela.
Não sinto
dores, acho que ele nem “permitiria”. Sinto a saudade de sempre. A saudade da
distância, daquele abraço gostoso e cheio de vida. A melhor maneira de
reproduzi-lo seria repetir o que escrevi naquele conto:
“Dali para o abraço, não houve tempo ou
espaço. Não importava o mundo, importava o encontro... e nós dois sabíamos o
que habitava ao fundo, sem palavras. Num relance, ainda na entrada, ao
vislumbrá-lo, confirmei apenas que nunca teria havido qualquer dúvida em meu
coração.
Nos sentamos
frente a frente, silenciosos, cúmplices, atores do drama, peças principais. Meu
pai se tornou pequeno, motivo, instrumento, jargão. O mundo se tornou ínfimo
diante da grandiosidade daquele homem, trinta anos mais velho do que eu...
poderia ter sido meu pai. Sua alma sempre quis ser meu pai. E esse era o olhar
que se desprendia dele para o meu rosto, conferindo a cria, que carregara no
colo. Suavidade e doçura de aldeão, semi-analfabeto nas letras, PHD em tudo
mais. Eu teria ficado assim, embevecida diante da grandiosidade daquele homem
horas a fio. Eu não me mexeria, se ele não se mexesse. Acho que ficamos assim,
esperando um ao outro, por algum tempo.”
Manuel me
dizia que morou no Brasil quando eu tinha cerca de 2 ou 3 anos de idade. Quase
trinta anos mais velho do que eu, seus olhos marejavam de lágrimas, quando me
dizia que tinha me carregado no colo muitas e muitas vezes e que me via adulta,
com orgulhos de pai.
E foi ele que
me pediu, na década de noventa, que lhe enviasse um retrato recente. Para me
fazer uma surpresa, sua carta seguinte me brindou com a foto que você vê
encimando este conto. Ele era assim: singelo, doce, verdadeiro, amoroso,
gentil.
Por mim, estaria desde já acertado: “Na próxima, topa ser meu pai
de verdade? Assim, a gente não corre o risco de ter de viver tão um longe do
outro...”
Da estrela
onde mora hoje, sei que olha pelos seus... e sei que olha também, com o mesmo
olhar meigo que sempre conheci, por esta “filhota” brasileira.
Parabéns
priminho querido! Pela vida, por sua alma valorosa e gentil, pelo brilho interior...
E... mil vezes
obrigada pelo amor verdadeiro que conheci através de você!!!